Como operar corretamente nos mercados de carbono?

O que procurar e o que evitar?
Medição de carbono e outros gases de efeito estufa em turfeiras, Iquitos, Perú. Junior Raborg/CIFOR-ICRAF

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Os mercados de carbono têm sido elogiados como uma parte crítica da abordagem à crise climática e criticados como greenwashing (lavagem ou maquiagem verde). De qualquer forma, estão movimentando muito dinheiro: o valor negociado no mercado global de créditos de carbono foi quase US$ 1 trilhão em 2022 e deverá atingir US$ 2.68 trilhões até 2028. 

Eles funcionam permitindo que indivíduos, empresas, governos e outras organizações compensem algumas de suas emissões de gases de efeito de estufa através do financiamento de projetos que reduzam ou removam as emissões de gases de efeito estufa (GEE) da atmosfera. 

A ética e as implicações de fazer isso são complexas. Para começar, existem preocupações legítimas com compradores que compram créditos em vez de priorizar suas próprias reduções de emissões, levando a acusações de “maquiagem verde” e dificultando qualquer ambição de uma redução rápida e drástica de emissões, que é urgentemente necessária – afinal, faltam apenas seis anos para 2030, e o planeta já aqueceu mais de 1,5 graus Celsius em 2023. 

Enquanto isso, as alegações de sequestro de carbono de muitos programas de créditos de carbono não resistiram às críticas, colocando em dúvida as credenciais verdes dos compradores: Shell, a gigante do petróleo e do gás, por exemplo, foi recentemente criticada por contabilizar mais de um milhão de créditos de carbono desacreditados para seus objetivos climáticos. 

No Centro de Pesquisa Florestal Internacional e Centro Internacional de Pesquisa Agroflorestal (CIFOR-ICRAF), acompanhamos os mercados e projetos de carbono durante anos, começando em 2009 com nosso trabalho em REDD+. Agora, elaboramos uma lista de princípios para o engajamento nos mercados de carbono, que podem ajudar a destacar projetos que tenham impactos positivos nas pessoas e nas paisagens – e evitar alguns dos problemas comuns apresentados na mídia ultimamente. 

Princípios para engajamento em mercados e programas de carbono 

Integridade: A mitigação das mudanças climáticas nos setores produtivos – incluindo energia, transporte, habitação, indústria transformadora, agricultura e muito mais – deve ser a principal prioridade; os créditos de carbono podem ser um cobenefício. Se assim for, esses não deveriam representar o “direito de poluir” para quem os compra, mas uma contribuição marginal para compensar qualquer atividade que não possa ser realizada com uma pegada menor. Não devem ser utilizados para promover reivindicações climáticas para empresas sem estratégias ambiciosas de responsabilidade climática, incluindo aquelas que procuram compensações sem primeiro demonstrar seus esforços para reduzir sua pegada climática. 

Credibilidade: Os programas de crédito de carbono devem utilizar métodos e metas baseados na ciência e resultados apoiados pela ciência. Isso inclui um monitoramento cuidadoso e contínuo do que está acontecendo com as florestas e as pessoas em uma área de projeto de carbono – e para além de suas fronteiras, para garantir que qualquer desmatamento evitado não se desloque para outro lugar (a chamada “fuga” de emissões). As ferramentas e os dados para resolver isso estão amplamente disponíveis: as ferramentas de mapeamento florestal baseadas em satélite podem monitorar o desmatamento em escalas mais amplas, e pesquisas como o nosso projeto GCS-REDD+ (o estudo comparativo global de REDD+) têm monitorado de perto os mecanismos de compartilhamento de benefícios para projetos de REDD+. 

Focar nas comunidades locais: As pessoas que vivem – e dependem – dos ecossistemas visados pelos créditos de carbono devem ser protegidas de resultados negativos não intencionais, como a deterioração dos seus meios de subsistência, voz ou senso de lugar. Muitos atores não levam suficientemente a sério a participação e atuação das comunidades locais, ou aprenderam como atenuar regras como os princípios do Consentimento Livre, Prévio e Informado (CLPI). Os mecanismos de mercado são inerentemente arriscados e os investidores mais bem equipados para assumir tais riscos devem garantir que esses riscos não sejam repassados às comunidades locais nos locais selecionados. 

Justiça: Qualquer valor criado nesse tipo de projeto deve ser compartilhado de forma justa. Isso significa considerar a viabilidade financeira de um projeto – as taxas atuais de mercado, o carbono para projetos de florestamento e reflorestamento cobre apenas uma fração dos custos de estabelecimento e gestão do projeto. Isso também significa considerar se tal projeto representará um aumento dos meios de subsistência dos participantes do projeto. A justiça não se trata apenas da repartição dos custos do projeto: essa deve também considerar os custos de oportunidade decorrentes da mudança do manejo da terra pelas comunidades locais exigida pelo crédito de carbono, bem como todos os benefícios. Trata-se também de compartilhar os benefícios de forma justa dentro e entre as comunidades envolvidas. 

Transparência: Em um contexto em movimento, complexo e exposto, a transparência e a boa gestão dos conflitos de interesses e da ética são cruciais. Como vimos no ano passado, os projetos de carbono devem estar sempre preparados para divulgação e abertos à crítica. 

Boa governança: É fundamental obter clareza sobre a propriedade da terra, das árvores e de todos os outros ativos nos quais se investe; desenvolver políticas claras sobre as tomadas de decisões e compartilhamento de benefícios; ter processos explícitos e ferramentas participativas adequadas para garantir que as vozes dos participantes do projeto sejam empoderadas e consideradas em todas as etapas do processo; e garantir que o Consentimento Livre, Prévio e Informado (CLPI) e as salvaguardas sociais e ambientais estejam em vigor. 

Apesar de todas as suas complexidades e desafios, os mercados de carbono são uma forma – entre muitas – de realizar a tão necessária mudança para a valorização dos serviços ecossistêmicos críticos, cujas contribuições precisam ser internalizadas na economia real. Se eles são bem projetados, executados e monitorados, os mercados de carbono podem servir a esse objetivo. Já temos todo um conjunto de princípios, ferramentas e abordagens em curso para preservar e restaurar ecossistemas, melhorando, ao mesmo tempo, os meios de subsistência das pessoas cujas vidas estão ancoradas neles. Precisamos apenas usá-los.

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